23/07/2018
Mecanismos criminosos que contaminaram o sistema de saúde são descritos na revista "The Lancet Oncology" de abril de 2018. Com o título "Drogas oncológicas na mira do crime farmacêutico", em tradução livre, o contundente artigo denuncia as engrenagens perversas utilizadas nesse mercado de bilhões de dólares.
Pesquisadores de Holanda, Itália, Suíça e França recorrem a mais de cem artigos científicos e relatórios da Organização Mundial da Saúde, da agência americana FDA e do Conselho da União Europeia. A partir disso, descrevem as diversas formas de lucrar com a falta de controle adequado na fabricação, distribuição e administração desses remédios oncológicos, que estão entre os cinco mais falsificados no mundo.
Na Suíça, na Alemanha, na Inglaterra e nos EUA, medicamentos foram roubados, armazenados em condições inadequadas, adulterados em laboratórios clandestinos e embalados com rótulos verdadeiros, ou seu princípio ativo foi misturado a substâncias inativas, sendo posteriormente vendidos a hospitais coniventes ou que não fiscalizavam suas compras.
No artigo, não há uma linha sequer sobre o Brasil! Só pode ter sido por falta de espaço, pois aqui ainda enfrentamos o escândalo da asparaginase, principal medicamento no tratamento de um tipo de leucemia em crianças. O Ministério da Saúde adquiriu uma droga chinesa seguindo a lei do menor preço, mas sem os testes confiáveis para comprovação de sua eficácia, mesmo após os respeitáveis pesquisadores do Instituto Boldrini, de Campinas, publicarem um artigo científico demonstrando que na droga havia muitas impurezas e uma menor quantidade do princípio ativo. Com a determinação do Ministério Público Federal de suspender sua distribuição, o ministério da Saúde decidiu comprar outra droga chinesa, com problemas semelhantes e, acreditem, vendida pelo mesmo distribuidor.
Está claro que o mercado globalizado contribuiu para a formação de cartéis, que impõem preços diferenciados e abusivos. Nesse vácuo, os laboratórios chineses e indianos de "fundo de quintal" inundam o mundo com drogas de baixo custo, mas de eficácia e segurança duvidosas. A importação oficial dessas pelo setor público poderá ser uma "tentação" para que parte do setor privado faça o mesmo.
Os pacientes têm o direito de saber qual produto foi prescrito pelo seu médico. No Brasil, o Conselho Federal de Medicina, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal estão sempre abertos para defender tanto os pacientes quanto seus médicos.
Alfredo Guarischi