ANO 03 Nº 6 - Outubro de 2000
CIRURGIA COLORRETAL VIDEOLAPAROSCÓPICA EM IDOSOS
LAPAROSCOPIC COLORECTAL SURGERY IN ELDERLY
Jayme Vital Santos Souza(1)
Ana Paula Weiring Carmel(2)
Adriana Conceição Nascimento de Mello(2)
RESUMO
Os autores demonstram os resultados obtidos em 37 pacientes com idade a partir de 65 anos, submetidos à cirurgia colorretal videolaparoscópica. A maioria dos pacientes era do sexo feminino, sendo câncer do reto a patologia mais freqüente. Ressecção anterior do reto, amputação abdomino-perineal e sigmoidectomia foram as cirurgias mais realizadas. A média do tempo operatório foi de 170,5 minutos, com um índice de complicações durante o ato cirúrgico de 13,5%. Dentre as complicações pós-operatórias, distúrbios respiratórios foram os mais freqüentes. O tempo médio de internação foi de 5,2 dias. Nesta série a ocorrência de óbito decorrente de complicações cirúrgicas foi de 4 pacientes, sendo metade destes casos devidos à Insuficiência de Múltiplos Órgãos e Sistemas (IMOS). Estes dados sugerem que a cirurgia colorretal realizada através de videolaparoscopia demonstrou ser segura e eficaz em pacientes idosos.
UNITERMOS: Cirurgia colorretal; videolaparoscopia; idosos.
INTRODUÇÃO
Com o aumento da expectativa de vida e possibilidade de diagnóstico mais precoce de doenças, houve um incremento de cirurgias em pacientes idosos (considerados aqueles com idade a partir de 65 anos). Estes pacientes têm uma alta incidência de patologias colorretais porém com freqüência, associa-se um alto índice de co-morbidade, possibilitando o aumento de complicações operatórias, especialmente cardíacas e respiratórias 1.
A cirurgia colorretal realizada através de videolaparoscopia tem demonstrado ser segura e factível, com redução da dor, íleo e tempo de internação pós-operatórios, morbidade inferior à cirurgia convencional, além de retorno mais precoce às atividades habituais 2,3,4,5. Considerando-se o índice acentuado de possíveis complicações em pacientes idosos, estes pacientes representam um grupo que se beneficia de uma cirurgia minimamente invasiva e com conseqüente recuperação mais precoce 6,7,8.
O objetivo deste estudo foi demonstrar os resultados da cirurgia colorretal videolaparoscópica realizada em pacientes idosos.PACIENTES E MÉTODOS
Foram avaliados 37 pacientes idosos, no período compreendido entre maio de 1995 e abril de 2000. a maioria dos pacientes era do sexo feminino (70,3%), com média de idade de 73,3 anos (65-94).
O estudo foi realizado prospectivamente e todos os pacientes foram submetidos à cirurgia colorretal realizada através de videolaparoscopia por um único cirurgião. Idade, sexo, diagnóstico, tipo de cirurgia, tempo operatório, complicações e evolução pós operatórios foram documentados e analisados. Para os pacientes portadores de câncer foi usada a Classificação de Dukes. Como causas de óbito, considerou-se mortalidade decorrente de complicações operatórias.RESULTADOS
Todos os procedimentos cirúrgicos foram realizados através de videolaparoscopia, sendo câncer de reto a sua indicação mais freqüente (45,8%) - Tabela 1 - e a ressecção anterior do reto, a cirurgia mais realizada (21,6%) - Tabela 2. O tempo operatório variou de 20 a 340 minutos, com média de 170,5 minutos; na maioria dos pacientes a anastomose foi extracorpórea. Ocorreram cinco complicações intra-operatórias: lesão em intestino delgado, cólon e reto; sangramento do plexo sacral e choque vasoplégico secundário às complicações anestésicas. A taxa de conversão foi de 2,7%. O período médio para eliminação de flauts e reintrodução de dieta oral foi de 1,9 dias (1-5). Dentre as complicações pós-operatórias, distúrbios respiratórios ocorreram em 2 pacientes (5,4%); as demais complicações são demonstradas na Tabela 3. O tempo de internação variou de 2 a 35 dias, com média de 5,2 dias.
Para a avaliação de pacientes com doença maligna foi usada a Classificação de Dukes, sendo a maioria dos casos Dukes B (52,1%) - Tabela 4.
INDICAÇÃO
N. DE CASOS
% Câncer de reto 17 45,8 Câncer de cólon direito 5 13,5 Câncer sigmóide 4 10,9 Doença diverticular 4 10,9 Megacólon chagásico 2 5,4 Enterocele 2 5,4 Câncer de cólon esquerdo 1 2,7 Câncer de cólon transverso 1 2,7 Linfoma 1 2,7 Tabela nº1 - Indicações para cirurgia
CIRURGIA
N. DE CASOS
% Ressecção anterior do reto 8 21,6 Sigmoidectomia 7 18,9 Cirurgia de Milles 4 10,9 Hemicolectomia direita 5 13,5 Duhamel modificado 2 5,3 Sigmoidectomia + Sacropromontofixação 1 2,7 Colectomia subtotal + Ileoreto anastomose 1 2,7 Hemicolectomia esquerda 1 2,7 Operação de Hartmann 1 2,7 Colostomia em sigmóide 1 2,7 Anastomose colo-anal + Ileostomia 1 2,7 Ileotransverso Anastomose 1 2,7 Outros 2 5,4 Tabela nº2 - Cirurgias realizadas
COMPLICAÇÕES
N. DE CASOS
% Respiratórias 2 5,4 IMOS 1 2,7 Estenose de anastomose 1 2,7 Abscesso pélvico 1 2,7 Gastroparesia 1 2,7 Deiscência parcial da parede abdominal 1 2,7 IAM 1 2,7 Distensão abdominal + vômitos 1 2,7 Tabela nº3 - Complicações pós-operatórias
CLASSIFICAÇÃO DE DUKES
N. DE CASOS
% A 5 21,7 B 12 52,3 C 3 13,0 D 3 13,0 Tabela nº4 - Classificação de Dukes
Neste estudo ocorreram 4 óbitos decorrentes de complicações operatórias: em 2 pacientes secundário à IMOS, 1 com infarto agudo do miocárdio e 1 caso devido à sepse.
DISCUSSÃO
Cirurgias colorretais convencionais têm taxas de morbidade que variam de 10 a 32% quando realizadas em pacientes jovens 7.
Em idosos, o índice de patologias colorretais é acentuado, bem como as complicações decorrentes de uma intervenção cirúrgica 6. O procedimento cirúrgico ideal, é aquele com mínima morbidade, curto período de recuperação pós-operatória e ótimos resultados funcionais. Sendo assim, há grandes vantagens neste grupo de pacientes comparando-se a cirurgia convencional à minimamente invasiva.
A cirurgia colorretal laparoscópica não tem demonstrado ser perigosa em termos de complicações intra ou pós-operatórias 9,10. Em nossa série, houve apenas um caso de corversão para cirurgia convencional (2,7%).
Alguns efeitos adversos têm sido relatados durante a laparoscopia, especialmente distúrbios ventilatórios e hemodinâmicos. Contudo, técnicas avançadas de monitorização da função cardiopulmonar e hemodinâmica têm demonstrado redução destes riscos e contribuem para a segurança da laparoscopia em idosos e pacientes de alto risco 11,12. Nos idosos, a função respiratória pode estar reduzida, possibilitando o aumento de complicações. Porém, no estudo apresentado, esta taxa foi de 5,4%, representando uma taxa aceitável para complicações pós-operatórias, não sendo portanto, decorrentes do procedimento laparoscópico.
O tempo operatório em cirurgia colorretal laparoscópica é maior se compararmos os dados da literatura relativos à cirurgia convencional porém, sem correlação com o aumento de complicações intra ou pós operatórias. Os pacientes cursam com redução do íleo, dor e tempo de internação pós-operatória, além de retorno mais precoce às atividades habituais 1,10,13,14. Estes dados são de grande importância na população avaliada, pois permitem uma mobilização pós-operatória precoce, reduzindo a necessidade de reabilitação nestes pacientes.
O tempo médio de internação foi de 5,2 dias, com o período mais longo de 35 dias, relativo a um paciente que evoluiu com IMOS. Considerando-se este caso como um fato isolado, a média de internação fica reduzida a 4,3 dias. Algumas séries demonstram períodos de internação de 10 a 17 dias em pacientes submetidos à cirurgia colorretal convencional e 6 a 9 dias no procedimento laparoscópico 11.
Estudos recentes demonstram bons resultados da laparoscopia para a cirurgia colorretal em idosos. Schwandner e cols. avaliaram prospectivamente 298 pacientes submetidos à cirurgia colorretal videolaparoscópica. Neste estudo, não houve diferença significativa em taxa de conversão ou morbidade, comparando-se pacientes idosos aos grupos mais jovens 10. Em 1999, Wexner e cols. também obtiveram resultados semelhantes, demonstrando que as técnicas laparoscópicas reduziram a morbidade e o período de reabilitação pós-operatória de forma semelhante em pacientes jovens e idosos 7.
Nosso estudo mostra que em pacientes idosos, a laparoscopia para a cirurgia colorretal foi eficaz e segura, com índice de complicações aceitável e compatível com dados da literatura.
SUMMARY
The authors demonstrate the results obtained in 37 patients with age starting from 65 years, submitted to the laparoscopic colorectal surgery. Most of these patients was women (70,3%); rectal cancer was the most frequent pathology (45,8%). Anterior resection, abdominoperineal resection and sigmoid resection were the accomplished surgeries. Mean operative time was 170,5 minutes, with 13,5% intra operative complications. Respiratory disturbances were the most frequent complications (5,4%). Mean length of hospitalization was of 5,2 days. In this study, the occurrence of death was of four patients, These data suggest that laparoscopic colectomy demonstrated to be effective in elderly patients.
Keywords: Colorectal Surgery; Laparoscopic, Elderly.
REFERÊNCIAS
1. Stewart, B. T.; Stitz, R. W.; Lumley, J. W.: Laparoscopiccally assisted colorectal surgery in the elderly. Br.J.Surg.; 86: 938-941, 1999.
2. Stocchi, L.; Nelson, H.; Young-Fadok, T. M.; Larson, D. R.; Itstrup, D. M.: Safety and advantages of laparoscopic vs. open colectomy inelderly. Dis Colon Rectum; 43: 326-332, 2000.
3. Souza, J. V. S.: Visão atual da cirugis colorretal laparoscópica. Rev. Bras. Colo-procto; 16 (3): 151-154, 1996.
4. Souza, J. V. S.; Carmel, A. P. W.; Martins, G.; Souza, M. M. B.; Silva, M. F. M.: Colectomia laparoscópica versus minilaparotomia: estudi comparativo. Rev. Bras. Colo-procto; 15 (1):11-14, 1997.
5. Souza, J. V. S.: Mini laparotomy versus laparoscopy: a comparative study. In: European Counvil of Coloproctology. Ed. Monduzzi, Italy: 181-183, 1997.
6. Delgado, S.; Lacy, A. M.; Garcia Valdecasas, J. C.; Balague, C.; Pêra, M.; Salvador, L.; Momblan, D.; Visa, J.: Could age be as indication for laparoscopic colectomy in colorectal cancer? Surg Endos; 14 (1(: 22-6, 2000.
7. Irotulam, A. J. M.; Chen, H. H.; Potenti, F. M.; Parameswaran, S.; Wexner, S. D.: Laparoscopic colectomy yields similar morbity and disability regardless of patients age. IntColorectal Dis; 14: 155-157, 1999.
8. Souza, J. V. S.; Carmel, A. P. W.; Martins, G.: Tratamento cirúrgico das doenças colorretais: estudo comparativo entre via laparoscópica e a convencional. Rev Col Bras Cir; 24 (5): 283-287, 1997.
9. Souza, J. V. S.; Carmel, A. P. W.: Colectomia laparoscópica para câncer colorretal. Rev Col Bras Cir; 23 (6): 349-352, 1996.
10. Schwandner, O.; Schiedeck, T. H. K.; Bruch, H. P.: Advanced age: indication or contraindication for laparoscopic colorectal surgery? Dis Colon Rectum, 42: 356-362, 1999.
11. Walsh, T. H.: Audit of outcome of major surgery in the elderly. Br J Surg; 83: 92-97, 1996.
12. Souza, J. V. S.; Carmel, A. P. W.; Martins, F., Santos, F. A.: Tratamento do megacólon chagástico por via laparoscópica. Rev Bras Colo-procto; 16 (3): 151-154, 1996.
13. Souza, J. V. S.; Carmel, A. P. W.; Martins, F. A.: Surgical treatment of chagasic megacolon: vídeo endoscopy approach. Surg Laparosc Endoscopy; 7: 166-170, 1997.
14. Souza, J. V. S.: hagas disease. In: Wexner, S. D., Sackier, J. M..Ed.Wiley-Liss, New York: 223-226, 1999.Endereço para correspondência:
Av. Antônio Carlos Magalhães, 585 - Sala 1407
Salvador - BA
(1) Diretor do Serviço de Cirurgia Colo Retal do Hospital Roberto Santos - Salvador - BA; Membro Titutlar e Qualificado pela SOBRACIL.
(2) Médicas Residentes do Serviço de Coloproctologia do Hospital Roberto Santos - Salvador - BA.